segunda-feira, 4 de abril de 2011

Minha criança,


Talvez lhe dissesse que há, para a vida, uma fórmula. Que nascemos, somos felizes e mantemos essa felicidade por toda a eternidade. Talvez lhe dissesse que o caminho é simples, que não se desiste dos sonhos, que “aquele alguém” é pra vida inteira. Talvez lhe dissesse que o amanhã sempre ilumina o ontem e que hoje jamais anoitece. Talvez lhe dissesse que lágrimas são apenas de emoção, que a tristeza é invenção dos poetas, que a loucura é privilégio dos loucos. Ah, como queria dizer que o homem é bom e confiável, que a humanidade está no caminho certo, que seus líderes sempre lhe dirão a verdade. Se eu pudesse, se eu pudesse. Talvez lhe dissesse que amigos são eternos, que a família não abandona, que sempre terá para quem voltar.
Talvez então, eu lhe dissesse que hoje o mundo está de braços abertos para todo e qualquer tipo de gente, para toda e qualquer opção filosófica, sexual, social. Talvez lhe dissesse que as guerras limitam-se ao cinema, que quando uma porta se fecha outras tantas se abrem.
Queria dizer que não sentirá ódio, que jamais desejará o mal, que nunca será egoísta. Queria ,mais ainda, dizer o mesmo sobre aqueles que vai encontrar. 
Talvez lhe dissesse que ao fim tem-se a certeza de missão cumprida, que não há arrependimentos ou desejos insatisfeitos.
Talvez lhe dissesse tudo isso, mas não posso. Não deixarei que se iluda tão cedo, que mais tarde sofra de desilusão. O que posso dizer é que nem toda lágrima, nem toda decepção e nem toda dor é em vão. Posso dizer que, vez ou outra, acreditará que tudo faz sentido e que a vida é um milagre. Posso dizer que alguns amores superarão grandes desamores e, que um dia, dirá o mesmo ao seu filho ou à criança que amar. Posso dizer e digo que lhe amo, que o observarei e que direi apenas a verdade, ainda que minha verdade seja apenas uma mentira sincera, na qual preferi acreditar.

Milagre do instante

Observei alguns milagres hoje. Vi preocupações desaparecerem, crianças tornarem-se adultos, o medo desmanchar-se em sorriso. Hoje vi a menina ser mãe, vi seu corpo movimentar para fazer ninar, vi seu calor acalentar o menino.
Filhos pais, pais avós, avós bisavós.  Todos assumiram novas funções e as exerciam com eufórica paz.
Era um silêncio satisfeito, eram olhares esperançosos, eram corações em ritmo tranqüilo. Enfim, a vida encontrara seu rumo na irracional, e, real razão de ser, existir, amar... viver.